Com os meus agradecimentos, "Os Pensadores Nacionais", por Paulo Rodrigues Ferreira, 00:04.
O acto de generalizar não representa o mais alto nível de honestidade intelectual, nem sequer para lá caminha, no entanto, quando se está a dar uma simples e banal opinião sobre determinado assunto, pouco importa que certas generalizações pareçam erradas a quem as possa vir a ler.
Assim sendo, sinto-me livre para divagar sobre aquilo que penso que sejam os pensadores nacionais.
Quando li a Arte de Ser Português, fiquei com a ideia de que Teixeira de Pascoaes tentava ser optimista em relação a um povo que não lhe dava grandes motivos para sorrir. Em relação a isso, já Miguel Esteves Cardoso me tinha alertado no seu prefácio ao livro: «Os Portugueses não queriam ser quem ele queria. Os Portugueses de Pascoaes nem sequer existiam. Pascoaes nunca percebeu que era tudo invenção dele.»
Eu diria mais: os portugueses de Pascoaes não eram bem portugueses, eram o mito. O mito de Camões, da pátria, de Afonso Henriques, de Vasco da Gama: «As Descobertas foram uma obra essencialmente portuguesa, porque o génio português, encarnado em Camões, lhe deu a forma espiritual, sublimada e eterna.»
A grandeza nacional não pode ser grande quando aquilo que verdadeiramente aconteceu foi sempre na direcção de um lento caminhar para a catástrofe.
Imagine-se se, em tempos de conquista, setenta por cento da população portuguesa passasse fome. Ou se, para que houvesse um Convento de Mafra, os desgraçados tivessem que agonizar. Pense-se que isso pode ter sido verdade.
Clara Pinto Correia, autora de um romance genial, diria melhor: «Se nós nem quando fizemos o nosso melhor fomos bons nisso, porque é que havíamos de ser bons agora fosse no que fosse, estafados, empobrecidos, sugados até ao tutano e com os restos atirados aos cães?» (Trinta Anos de Democracia – E Depois, Pronto).
Por que motivo os portugueses passam a vida a pensar que têm uma superioridade moral em relação a tudo o que não é «nosso»? Já se sabe: não há comida como a portuguesa, não há hino tão bonito como o nosso, não há cidade mais bonita do que Lisboa e praias mais vistosas do que as do Algarve ou de Santa Cruz ou da Ericeira.
A língua portuguesa é, surpresa das surpresas, a mais complexa das línguas. Pois.
Uma generalização: o pensador português é alguém que me irrita. Ainda não começou a escrever e já sei que vou achar pretensioso, ridículo, idiota, imbecil, analfabeto.
Digam-me que não é bem assim, que temos homens de valor como Eduardo Lourenço ou Jorge de Sena. Pois sim. Lourenço vive em França, Sena viveu no Brasil e, posteriormente, nos Estados Unidos.
Sartre, Camus, Aron, Heidegger, Berlin, Popper, Hayek? Não são portugueses. Resta o pensador português que, embora não pertença verdadeiramente a nenhuma elite cultural, se julga dotado, não só de um QI de proporções dantescas, como de uma moral superior a qualquer outra coisa que seja diferente da sua voz.
O intelectual português não fala para mais ninguém do que para ele próprio. Verdade seja dita: só poderia ser dessa maneira. Intelectual nacional que tivesse verdadeiro público, deveria preparar-se para levar com quilos de tomates em público. Mas não. O intelectual fala para dentro. O público não ouve, não escuta, não quer saber. E, quando quer saber, quando se interessa, é para imitar, para copiar, para ser igual ou melhor do que o intelectual que fala para si próprio.
Verdadeiros génios em Portugal? O Nobel iberista, José Saramago? Não vive em Portugal e, por mais qualidades que possa ter, é bom em tudo menos a ter ideias.
Os escritores são bons em Portugal, diz-se. Os poetas portugueses ainda são melhores do que tudo o resto que possa existir no país. Pois bem. Caro leitor: tem lido poesia portuguesa? Gosta? Se gosta, tem o hábito de ler poesia estrangeira? Se tem, por que motivo consegue gostar da poesia que se publica actualmente em Portugal?
Um poeta actualmente genial dentro de portas: nenhum. Não há nenhum génio a escrever versos em Portugal (não digo onde vivo, para que não me queiram linchar). Todavia, admito que possa existir algo para além do normal, do medíocre, a respirar dentro de fronteiras.
Já dizia Rubem Fonseca que nenhum escritor admite a sua mediocridade. Quem me estiver a ler, pensará «o tipo é um idiota, não conhece a minha escrita brilhante.» Claro.
Paulo Rodrigues Ferreira
O acto de generalizar não representa o mais alto nível de honestidade intelectual, nem sequer para lá caminha, no entanto, quando se está a dar uma simples e banal opinião sobre determinado assunto, pouco importa que certas generalizações pareçam erradas a quem as possa vir a ler.
Assim sendo, sinto-me livre para divagar sobre aquilo que penso que sejam os pensadores nacionais.
Quando li a Arte de Ser Português, fiquei com a ideia de que Teixeira de Pascoaes tentava ser optimista em relação a um povo que não lhe dava grandes motivos para sorrir. Em relação a isso, já Miguel Esteves Cardoso me tinha alertado no seu prefácio ao livro: «Os Portugueses não queriam ser quem ele queria. Os Portugueses de Pascoaes nem sequer existiam. Pascoaes nunca percebeu que era tudo invenção dele.»
Eu diria mais: os portugueses de Pascoaes não eram bem portugueses, eram o mito. O mito de Camões, da pátria, de Afonso Henriques, de Vasco da Gama: «As Descobertas foram uma obra essencialmente portuguesa, porque o génio português, encarnado em Camões, lhe deu a forma espiritual, sublimada e eterna.»
A grandeza nacional não pode ser grande quando aquilo que verdadeiramente aconteceu foi sempre na direcção de um lento caminhar para a catástrofe.
Imagine-se se, em tempos de conquista, setenta por cento da população portuguesa passasse fome. Ou se, para que houvesse um Convento de Mafra, os desgraçados tivessem que agonizar. Pense-se que isso pode ter sido verdade.
Clara Pinto Correia, autora de um romance genial, diria melhor: «Se nós nem quando fizemos o nosso melhor fomos bons nisso, porque é que havíamos de ser bons agora fosse no que fosse, estafados, empobrecidos, sugados até ao tutano e com os restos atirados aos cães?» (Trinta Anos de Democracia – E Depois, Pronto).
Por que motivo os portugueses passam a vida a pensar que têm uma superioridade moral em relação a tudo o que não é «nosso»? Já se sabe: não há comida como a portuguesa, não há hino tão bonito como o nosso, não há cidade mais bonita do que Lisboa e praias mais vistosas do que as do Algarve ou de Santa Cruz ou da Ericeira.
A língua portuguesa é, surpresa das surpresas, a mais complexa das línguas. Pois.
Uma generalização: o pensador português é alguém que me irrita. Ainda não começou a escrever e já sei que vou achar pretensioso, ridículo, idiota, imbecil, analfabeto.
Digam-me que não é bem assim, que temos homens de valor como Eduardo Lourenço ou Jorge de Sena. Pois sim. Lourenço vive em França, Sena viveu no Brasil e, posteriormente, nos Estados Unidos.
Sartre, Camus, Aron, Heidegger, Berlin, Popper, Hayek? Não são portugueses. Resta o pensador português que, embora não pertença verdadeiramente a nenhuma elite cultural, se julga dotado, não só de um QI de proporções dantescas, como de uma moral superior a qualquer outra coisa que seja diferente da sua voz.
O intelectual português não fala para mais ninguém do que para ele próprio. Verdade seja dita: só poderia ser dessa maneira. Intelectual nacional que tivesse verdadeiro público, deveria preparar-se para levar com quilos de tomates em público. Mas não. O intelectual fala para dentro. O público não ouve, não escuta, não quer saber. E, quando quer saber, quando se interessa, é para imitar, para copiar, para ser igual ou melhor do que o intelectual que fala para si próprio.
Verdadeiros génios em Portugal? O Nobel iberista, José Saramago? Não vive em Portugal e, por mais qualidades que possa ter, é bom em tudo menos a ter ideias.
Os escritores são bons em Portugal, diz-se. Os poetas portugueses ainda são melhores do que tudo o resto que possa existir no país. Pois bem. Caro leitor: tem lido poesia portuguesa? Gosta? Se gosta, tem o hábito de ler poesia estrangeira? Se tem, por que motivo consegue gostar da poesia que se publica actualmente em Portugal?
Um poeta actualmente genial dentro de portas: nenhum. Não há nenhum génio a escrever versos em Portugal (não digo onde vivo, para que não me queiram linchar). Todavia, admito que possa existir algo para além do normal, do medíocre, a respirar dentro de fronteiras.
Já dizia Rubem Fonseca que nenhum escritor admite a sua mediocridade. Quem me estiver a ler, pensará «o tipo é um idiota, não conhece a minha escrita brilhante.» Claro.
Paulo Rodrigues Ferreira
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